"Aqueles que parecem mais preocupados com o que há de mais profundo, esses poderão decerto dizer que a forma é algo de exterior e alheio à natureza da coisa, e esta é tudo o que importa; poderão dizer que a missão do escritor, e sobretudo do filósofo, é descobrir verdades, afirmar verdades, divulgar verdades e conceitos válidos. Mas, se depois de os ouvir, formos verificar como na realidade cumprem essa missão, o que encontraremos será o mesmo velho palavreado, cozido e recozido. Terá esta ocupação o mérito de formar e despertar sentimentos, mas antes deverá considerar-se como uma agitação supérflua. 'Têm eles Moisés e os profetas; ouçam-nos' (Lc 16,29). O que sobretudo nos espanta é o tom e a pretensão que assim se manifestam, como se o que sempre tivesse faltado no mundo fossem esses zelosos propagadores de verdades, como se a velha sopa recozida trouxesse novas e inauditas verdades, como se fosse sempre 'precisamente agora' a ocasião de as ouvir. Por outro lado, verifica-se que um lote de tais verdades propostas aqui é submergido e abafado por outras verdades da mesma espécia divulgadas ali. Como é que se pode distinguir dessas considerações informes e infundadas o que nesse turbilhão de verdades não é velho nem novo, mas permanente?"
Um heraclitiano rejeitaria a possibilidade desta distinção: há sempre velho e sempre novo, nada permanece senão a mudança, e sem se comprometer com a existência ontológica ou fenomenológica do mundo, cremos: tudo flui. E se reclamarem a veracidade ou a importância de uma indagação mais profunda a esse respeito, cito Hume: "Feliz de nós se temos a consciência de nossa temeridade quando tentamos aprofundar nesses sublimes mistérios e, abandonando uma cena tão repleta de dificuldades e obscuridades, retornamos, com decorosa modéstia, à nossa província própria e verdadeira, que é o estudo da vida ordinária (ou o simples viver), onde não nos faltarão problemas com que entreter-se, sem termos de mergulhar num oceano ilimitado de dúvidas, incertezas e contradições..."
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