Poucos dias atrás estava lendo Hume, e confesso que me simpatizei com sua forma de escrever e com os seus pensamentos.
Hume é considerado um compatibilista: ele crê que a liberdade e a necessidade possam ser analisadas dentro do mesmo patamar. Elas são amiguinhas, passeiam juntas e andam até de mãos dadas...
Mas o que é necessidade e o que é liberdade?
Necessidade (alguns chamam de natureza), explicando em termos gerais, é o determinismo natural a que todos os seres humanos estão submetidos.
Vamos pensar da seguinte forma: um copo d'água de 200 ml é submetido a uma temperatura inferior a 0º celsius por um período x. Depois desse tempo, a água estará congelada.
Qual a causa da solidificação? Temperatura inferior a 0º por um período x.
Qual o efeito? A solidificação da água.
Se repetirmos o experimento acima ∞ vezes, sob as mesmas condições, o resultado será o mesmo, não é? Espero que ninguém discorde ou prove o contrário, o que seria pior...
De certa forma, as ações humanas não fogem desse padrão (se fugissem seria impossível o estudo das ciências humanas e sociais). Mas alguém poderia dizer: mas os homens não agem de forma igual sempre, há casos que sob as mesmas condições aparentes uma pessoa seria capaz de colocar fogo no mendigo que está deitado no banco, enquanto outra daria uma esmola ao coitado.
Qual a causa da solidificação? Temperatura inferior a 0º por um período x.
Qual o efeito? A solidificação da água.
Se repetirmos o experimento acima ∞ vezes, sob as mesmas condições, o resultado será o mesmo, não é? Espero que ninguém discorde ou prove o contrário, o que seria pior...
De certa forma, as ações humanas não fogem desse padrão (se fugissem seria impossível o estudo das ciências humanas e sociais). Mas alguém poderia dizer: mas os homens não agem de forma igual sempre, há casos que sob as mesmas condições aparentes uma pessoa seria capaz de colocar fogo no mendigo que está deitado no banco, enquanto outra daria uma esmola ao coitado.
Claro, perfeitamente possível. E Hume explica: há peculiaridades que diferenciam os homens uns dos outros. Nós não somos robôs, que viemos da mesma fábrica, produzidos e programados da mesma forma para agir sob a condição 1 de forma x e sob a condição 2 de forma y. Onde se encontram essas peculiaridades? Ora bolas, no caráter. O que define o caráter?
Aaaaahhhh, esse é o ponto. Skinner, um psicólogo estadunidense, poderia dizer (ele não disse, não que eu saiba, mas flertaria com tal frase) que "o homem é fruto de seu meio". Você, que ia pra escola e ganhava uma estrelinha quando fazia a tarefa de casa. E uma bronca quando pegava o lápis do colega sem pedir emprestado...
Behaviorismo: os estímulos e as condições do meio (ou condições naturais) determinam o caráter (opa, eu li determinam?) do homem.
Perfeito. Vamos voltar então ao início do post e colocar pingos em alguns is.
Está escrito lá em cima: "Necessidade (...), é o determinismo natural a que todos os seres humanos estão submetidos."
Você pode estar pensando: é, mais lá em cima você falou que o Hume era compatibilista, que colocava a LIBERDADE e a NECESSIDADE no mesmo plano. Mas como eu posso ser livre, se minhas ações são determinadas pelo meu caráter (ou não), e meu caráter é determinado por estímulos do meio em que me encontro?
Ora, mas eu não sou livre. Olha só, sou oprimido pela sociedade, mal tenho dinheiro pra pagar minhas contas, o sistema é culpado pela minha desgraça.
Mas para Hume, você é livre. Porque Hume coloca a liberdade num posto menos elevado do que Kant, por exemplo. E o que é ser livre? Simples, se você faz o que você tem vontade de fazer, você é livre. Se você é coagido a agir de alguma forma, você não é livre.
Ah mas eu não sou livre pra comprar uma Ferrari nem pra morar nas Bahamas porque eu sou oprim...
Calma, há diferenças entre vontade e desejos, ou melhor, entre vontade e poder. Um indivíduo que pode escolher entre Ferrari, Porsche, Jaguar, BMW, é mais livre do que o que só pode escolher entre Chevrolet Celta, Volkswagen Gol, Ford Ka ou Fiat Uno?
Poder não determina liberdade, ou vice-versa.
Ainda sim, Hume está meio que, não sei se posso dizer, ferrado. Vejamos: minha vontade é determinada pelo meio. Se eu ajo conforme a minha vontade, minha ação é livre. Mas minha vontade não é livre.
Logo, se minha vontade é determinada pelo meio, minhas ações também o são.
Ufa, quantas voltas eu dei pra chegar nesse ponto.
E a questão fundamental aqui é a seguinte: como eu posso ser considerado responsável pelas minhas ações, se elas são frutos das determinações e estímulos que recebo do meio?
Deixo vocês pensarem a esse respeito, enquanto eu vou jogar PlayStation 2...